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terça-feira, 8 de abril de 2025

A FONTE DA ESPERANÇA



Fonte da Praça de Espanha - Roma - Itália


Na praça da pequena cidade, situada em frente à igreja, a atmosfera era de festa. O espaço, lotado, mal comportava a multidão. Era dia santo, e todos aguardavam ansiosamente o início da procissão, atravessando a praça com entusiasmo.

Em outros tempos, esse mesmo lugar testemunhou os proclamas do alcaide, que, diante da população reunida, anunciava impostos severos. Esses encargos, pagos com enorme sacrifício, faziam o povo amaldiçoar o velho administrador, cuja memória era perpetuada em uma estátua de granito branco. A obra, esculpida por um mestre vindo da cidade grande, nunca foi paga, deixando o artista indignado. Ele amaldiçoou o solicitante no dia em que partiu.

O alcaide era conhecido por desviar recursos públicos para o conforto de seu castelo, negligenciando o investimento em obras essenciais para a comunidade. Apesar disso, a cidade tinha um charme singular. Seus muros medievais cercavam construções seculares, vielas sombreadas e floreiras perfumadas. Nas janelas, senhoras faziam pedidos aos vendedores de frutas e verduras que circulavam pelas ruas estreitas.

Aquele dia, no entanto, era especial. Dias antes, o pároco recebeu um recado do Prefeito para ser anunciado na missa de domingo: algo importante seria revelado antes da procissão. O boato percorreu fronteiras, trazendo o escultor de volta à cidade, ansioso por receber pelo trabalho que tanto impressionava os moradores.

Na praça, o padre esperava impacientemente pelo mensageiro, que chegou ao som de cavalos galopantes. Após tomar um gole d’água oferecido por um aldeão, ele começou a ler o pergaminho:

— Por ordem de nosso querido Prefeito, informo que...

Nesse momento, um estrondo ecoou pelo céu, seguido por uma forte ventania que arrancou o pergaminho de suas mãos. O papel caiu próximo ao escultor, que, ao lê-lo, ficou profundamente abalado. A chuva repentina fez o povo buscar abrigo na igreja, enquanto o escultor, imóvel e tomado pela indignação, amassava o pergaminho e soltava urros.

Determinado, ele dirigiu-se a uma loja de ferragens, apanhou uma marreta e voltou à praça. Golpe após golpe, destruiu a estátua até restar apenas sua base. No último golpe, um jorro d’água alcançou seu rosto cansado. Ele havia atingido o velho aqueduto que abastecia a cidade.

Nesse instante, sua fúria deu lugar à clareza. Olhando para o povo ao redor, exclamou:

— Neste lugar construirei uma fonte, para refrescar os moradores nos dias de verão e para inspirar contemplação.

Pierluigi, um comerciante rico e amante das artes, que observava a cena, aproximou-se e disse:

— Signor Domenico, serei seu patrono. Hospede-se em meus aposentos e dê início à obra. Financiei tudo por nossa gente, para trazer alegria à cidade.

Dom Cármino, enfurecido com a iniciativa, tentou impedir a construção, mas foi vencido pela união do povo, que apoiava o escultor e vigiava o local dia e noite. Curiosos perguntavam insistentemente:

— Signor Domenico, o que dizia o pergaminho?

Ele respondia:

— Não posso revelar. Com o tempo, todos entenderão meu gesto.

Quando a fonte foi concluída, a cidade celebrou com danças e músicas em homenagem às águas cristalinas e à primavera, que enchia as mãos de flores. A obra simbolizava um novo tempo de esperança e união.

Antes de partir, Domenico recebeu o pagamento de Pierluigi, que mais uma vez perguntou:

— Domenico, o que dizia o pergaminho que chegou às suas mãos?

O escultor sorriu e respondeu:

— “O cuore há speranza che scorre fonti” (O coração tem esperança, faz jorrar as fontes).

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