Na
praça da pequena cidade, situada em frente à igreja, a atmosfera era de festa.
O espaço, lotado, mal comportava a multidão. Era dia santo, e todos aguardavam
ansiosamente o início da procissão, atravessando a praça com entusiasmo.
Em
outros tempos, esse mesmo lugar testemunhou os proclamas do alcaide, que,
diante da população reunida, anunciava impostos severos. Esses encargos, pagos
com enorme sacrifício, faziam o povo amaldiçoar o velho administrador, cuja
memória era perpetuada em uma estátua de granito branco. A obra, esculpida por
um mestre vindo da cidade grande, nunca foi paga, deixando o artista indignado.
Ele amaldiçoou o solicitante no dia em que partiu.
O
alcaide era conhecido por desviar recursos públicos para o conforto de seu
castelo, negligenciando o investimento em obras essenciais para a comunidade.
Apesar disso, a cidade tinha um charme singular. Seus muros medievais cercavam
construções seculares, vielas sombreadas e floreiras perfumadas. Nas janelas,
senhoras faziam pedidos aos vendedores de frutas e verduras que circulavam
pelas ruas estreitas.
Aquele
dia, no entanto, era especial. Dias antes, o pároco recebeu um recado do
Prefeito para ser anunciado na missa de domingo: algo importante seria revelado
antes da procissão. O boato percorreu fronteiras, trazendo o escultor de volta
à cidade, ansioso por receber pelo trabalho que tanto impressionava os
moradores.
Na
praça, o padre esperava impacientemente pelo mensageiro, que chegou ao som de
cavalos galopantes. Após tomar um gole d’água oferecido por um aldeão, ele
começou a ler o pergaminho:
—
Por ordem de nosso querido Prefeito, informo que...
Nesse
momento, um estrondo ecoou pelo céu, seguido por uma forte ventania que
arrancou o pergaminho de suas mãos. O papel caiu próximo ao escultor, que, ao
lê-lo, ficou profundamente abalado. A chuva repentina fez o povo buscar abrigo
na igreja, enquanto o escultor, imóvel e tomado pela indignação, amassava o
pergaminho e soltava urros.
Determinado,
ele dirigiu-se a uma loja de ferragens, apanhou uma marreta e voltou à praça.
Golpe após golpe, destruiu a estátua até restar apenas sua base. No último
golpe, um jorro d’água alcançou seu rosto cansado. Ele havia atingido o velho
aqueduto que abastecia a cidade.
Nesse
instante, sua fúria deu lugar à clareza. Olhando para o povo ao redor,
exclamou:
—
Neste lugar construirei uma fonte, para refrescar os moradores nos dias de
verão e para inspirar contemplação.
Pierluigi,
um comerciante rico e amante das artes, que observava a cena, aproximou-se e
disse:
—
Signor Domenico, serei seu patrono. Hospede-se em meus aposentos e dê início à
obra. Financiei tudo por nossa gente, para trazer alegria à cidade.
Dom
Cármino, enfurecido com a iniciativa, tentou impedir a construção, mas foi
vencido pela união do povo, que apoiava o escultor e vigiava o local dia e
noite. Curiosos perguntavam insistentemente:
—
Signor Domenico, o que dizia o pergaminho?
Ele
respondia:
—
Não posso revelar. Com o tempo, todos entenderão meu gesto.
Quando
a fonte foi concluída, a cidade celebrou com danças e músicas em homenagem às
águas cristalinas e à primavera, que enchia as mãos de flores. A obra
simbolizava um novo tempo de esperança e união.
Antes
de partir, Domenico recebeu o pagamento de Pierluigi, que mais uma vez
perguntou:
—
Domenico, o que dizia o pergaminho que chegou às suas mãos?
O
escultor sorriu e respondeu:
— “O cuore há speranza che scorre fonti” (O coração tem esperança, faz jorrar as fontes).
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