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quinta-feira, 8 de maio de 2025

O CAIXEIRO VIAJANTE E O SARGENTO




DEPOIS DO JANTAR COMEÇOU ARRUMAR A MALA

Valdemar era um paulistano da gema, homem educado e bem vivido. Sempre impecável, trajava ternos alinhados, mantinha a barba e o cabelo aparados, unhas cortadas e sapatos engraxados com brilho de espelho. Como caixeiro-viajante, sabia que a primeira impressão fazia toda a diferença, e, antes de visitar clientes, aplicava uma loção discreta, garantindo que sua presença fosse memorável.

Tinha o dom da persuasão e uma clientela fiel espalhada pelo interior do estado e pelo sul de Minas Gerais. Seu talento para vender produtos vinha não apenas de sua eloquência, mas da forma elegante como conquistava seus fregueses.

Na manhã de segunda-feira, enquanto se preparava para sair, disse à esposa, Alzira, que o ouvia com um sorriso no rosto:

— Hoje à noite viajo para o sul de Minas. Volto na quinta-feira. Prepare um bom jantar, porque vou sentir falta da sua comida.

Chegou apressado para jantar por volta das oito da noite, querendo se acomodar rapidamente para assistir ao jogo de seu amado Corinthians, onde Ronaldo Fenômeno prometera marcar dois gols. Entre garfadas e goles de suco, Valdemar antecipava sua torcida.

Depois do jantar, começou a arrumar a mala. Entre uma peça de roupa e outra, dividia sua atenção com o jogo. Sempre que parecia monótono, corria para o quarto pegar mais roupas, garantindo que não perderia nenhuma jogada importante. Foi então que Ronaldo marcou o primeiro gol, e Valdemar veio correndo para a sala, lamentando:

— Maldição! Perdi o gol! Será que vão repetir a jogada?

Na repetição, vibrou e provocou Alzira:

— Não é que o gordo está cumprindo a promessa? Só falta mais um!

Em meio à empolgação, lembrou-se de pegar um par de sapatos sobressalentes. Abriu a sapateira e, no momento em que segurava o calçado, ouviu o locutor gritar animado:

— Gol de Ronaldo!

Valdemar correu para a sala, pulando como um garoto, abraçou Alzira e, no meio da empolgação, jogou-lhe um tapa brincalhão.

Foi então que, ao tentar guardar os sapatos, percebeu que estavam sujos. Queria trocá-los, mas o jogo estava tão emocionante que desistiu. Decidiu limpá-los depois e os deixou perto da cortina, junto à parede.

— Vou embora. Beijo, amor! Vou ouvir o resto do jogo no rádio do carro.

Saiu apressado, enquanto Alzira, já sonolenta, foi para o quarto. Mas, no meio da madrugada, foi despertada por vozes estranhas.

Sentiu o coração acelerar. Seria um ladrão?

Foi na ponta dos pés até a sala, onde o som persistia. “Valdemar foi embora e não desligou a TV”, pensou aliviada. Mas, quando se aproximou, viu, sob a cortina, os sapatos que ele esquecera. O sangue gelou.

“Aquilo não é só um sapato… tem alguém atrás da cortina!”

O medo tomou conta. Com mãos trêmulas, discou o número da polícia e pediu urgência. Quinze minutos depois, bateram à porta.

Era o sargento Nepomuceno, um homem corpulento e de expressão rígida.

— O bandido ainda está aqui? — perguntou, sacando o revólver.

— Sim! Veja ali, atrás da cortina!

Com precisão, Nepomuceno avançou na ponta dos pés. Em um movimento rápido, puxou a cortina, pronto para dar voz de prisão…

E encontrou o quê? Nada. Apenas o par de sapatos.

Alzira ainda tremia, mas logo caiu na risada, percebendo o equívoco. O sargento relaxou, mas seus olhos passaram a percorrer lentamente o corpo da mulher, observando cada detalhe com uma intensidade desconfortável.

Ele prolongou a conversa, pedindo café, elogiando a casa, desviando o olhar para a peça de roupa íntima que contrastava com o tecido preto da capa rendada.

— Sabe, dona Alzira, sustos assim fazem a gente precisar de um bom café. E se tiver algo doce, melhor ainda.

Ela percebeu a indiscrição e rapidamente encerrou a conversa, sem atender ao pedido. Mas o sargento não se deu por vencido e continuou ali, como se esperasse que a situação lhe oferecesse uma chance maior.

— Esse tipo de situação deixa a pessoa nervosa… Bom mesmo seria um copo d’água para acalmar.

Ainda hesitante, Alzira virou-se para pegar a água, mas com a sensação incômoda de que os olhos do sargento a seguiam como uma sombra. Quando voltou, ele sorriu com um jeito que parecia ultrapassar o limite da mera gentileza.

— Ah, dona Alzira, como tem gente descuidada por aí, não é? Melhor manter as portas bem trancadas.

Ela agradeceu e pediu que ele se retirasse, tentando esconder o desconforto que tomava conta dela. Sem alternativa, Nepomuceno saiu, mas Alzira sabia que não seria a última vez que o veria.

Passado mais um dia, escutou batidas na porta da sala. Ficou temerosa e verificou se estava vestida adequadamente antes de perguntar:

— Quem é?

— É o sargento Nepomuceno; vim trazer os sapatos do seu marido, posso entrar?

Seu coração disparou. Ele havia levado os sapatos intencionalmente?

— Pode deixar aí fora, depois eu pego.

— Mas eu limpei e engraxei, ficaram brilhando! Abra a porta para ver.

Agora ela sabia que ele estava apenas buscando mais uma desculpa para entrar.

Rapidamente, pegou o telefone e ligou para a delegacia, denunciando o sargento e sua insistência. Mas, quando voltou para verificar, não havia mais resposta.

Girou a chave, abriu a porta com cuidado…

Os sapatos estavam na soleira...

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🔅Acredito que a escrita é uma arte em constante evolução, refinada pelo hábito, pela observação e, principalmente, pelo desejo de transmitir emoções e ideias de forma mais autêntica. 

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