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terça-feira, 20 de maio de 2025

O SOM DOS ANOS DOURADOS - ANNI MODERNI

 
ANNI MODERNI
Memórias Douradas

Em uma velha caixa de papelão, repousavam ecos de um tempo que se perdeu nas dobras da memória. Fotografias amareladas, recortes de jornal, vestígios de um passado que, ao serem tocados, despertaram lembranças como folhas ao vento.

Abri essa janela do tempo e vi os dias dourados renascerem, os anos de juventude pulsando em cada registro. Entre os tesouros guardados, uma imagem destacou-se: lá estava eu, jovem e audacioso, tocando bateria na orquestra das domingueiras matinais, aquelas que se acendiam no Clube Grêmio dos Ferroviários logo após a missa das nove horas na igreja da Matriz.

Era a época do frenesi juvenil. Uns corriam para o Cine Ypiranga, ansiando por risos e travessuras de Tom e Jerry, enquanto outros, seduzidos pelo frenético ritmo do rock, desciam para dançar na rua logo abaixo da praça. Elvis Presley era o rei, sua voz ecoava incessante nas rádios, e nós, músicos apaixonados, o evocávamos em acordes selvagens e melodias de pura devoção.

Nosso próprio Elvis, Ted Milton, encarnava a essência do astro: voz imponente, presença magnética, e um balanço que arrebatava os sentidos. Tutti Frutti incendiava a pista, Blue Suede Shoes fazia os pés rodopiarem, enquanto Love Me Tender e Always On My Mind se tornavam os suspiros de almas enamoradas.

Até que, como um acorde interrompido, as domingueiras silenciaram. Os músicos chegavam cansados dos bailes de sábado, e eu, que só tocava aos domingos, senti a tristeza de ver aquele ritual desaparecer.

Mas a música não aceita despedidas, apenas metamorfoses. Assim nasceu o trio, pequeno em número, mas imenso em sonho. As primeiras “brincadeiras dançantes” aconteceram timidamente, inspiradas pelos filmes americanos. A primeira delas, na casa de uma moça cujo nome a névoa do tempo apagou, quase não aconteceu – até que os pais, após muita conversa, abriram as portas para nossa arte.

A grande garagem nos recebeu como palco. O piano, sentinela de melodias, tornava-se a espinha dorsal do trio. Eu, Tony Vendra, estampava meu nome no surdo de pedal da bateria que meus pais me concederam após tanta insistência. Ao meu lado, Joel das “Candongas” no piano e Joãozinho “Boa-Pinta” ao saxofone.

Com camisas vermelhas e calças negras, éramos uma visão. Meu pai, com paciência e afeto, transportava a bateria no Ford que parecia uma barca, e assim seguíamos para onde a música nos chamasse.

As canções italianas imperavam e, por ordem dos anfitriões, as melodias deveriam ser suaves, próprias para danças de rosto colado e murmúrios secretos trocados ao pé do ouvido.

A primeira nota da noite pertencia à delicada Non Ho L’età, interpretada por uma menina do grupo, ecoando o timbre de Gigliola Cinquetti. A canção falava de juventude e espera, encantando os pais e aquecendo os corações juvenis.

Nossa fama crescia. Professores dançavam, alunos conversavam na escola sobre os próximos encontros, e nos intervalos das festas, floresciam poesias declamadas com brilho e emoção.

Até os adultos deixavam escapar pequenos excessos. O ponche servido pela mãe da anfitriã, insuspeito em sua doçura, recebia, como um segredo, um toque de vodka, e então, alegrias se multiplicavam, verdades eram ditas, declarações floresciam ao som do nosso trio.

O encanto era tanto que alguns jovens levavam a dança para as ruas, e ali, entre olhares de aprovação e reprovação dos vizinhos, o ritmo se espalhava como uma brisa inquieta.

Foi nesse turbilhão de música e vida que recebi um convite inesperado: aos sábados pela manhã, eu atenderia telefonemas na rádio Difusora, selecionando canções e declamando versos escolhidos com o programador.

A recompensa? Entradas para os cinemas Ypiranga e Marabá – um prêmio que era, para mim, tão valioso quanto os aplausos que ecoavam em nossas apresentações.

E eu tinha uma exigência: apenas música italiana. Assim, garantíamos que ressoassem nas ondas do rádio as vozes de ícones como John Foster, Lorella Vital, Pino Donaggio, Sérgio Endrigo, Peppino Di Capri e Luigi Tenco.

Mas acima de todos, havia Modugno, o poeta da canção. Sua voz preenchia o silêncio com magia, suas composições atravessavam fronteiras e, quando ele veio ao Brasil, deixou sua marca de maneira inesquecível.

Hoje, folheando essas memórias, revivendo os dias de juventude efervescente e melodias que nunca envelhecem, sinto no peito um misto de saudade e gratidão. Os Anni Moderni foram mais que um tempo. Foram um sentimento, um instante eterno, uma melodia que ainda ressoa na alma.

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