UM RELÂMPAGO RESGOU O CÉU
Era uma noite escaldante de verão. A lua cheia lançava sua luz prateada sobre a janela aberta daquele ranchinho, já castigado pelo tempo. O vento começou a soprar forte, anunciando a chegada de uma tempestade, e os estalos da madeira misturavam-se ao som dos trovões distantes.
No interior do quarto simples, sobre um colchão de palha sem nenhuma coberta, repousava um velho caboclo. O rangido da janela contra a parede de taipa ecoava pelo espaço, fazendo o reboco se desprender e se espalhar pelo chão de terra batida. Cada ruído despertava memórias de um tempo que parecia tão distante, mas que ainda ardia em seu peito.
Um relâmpago rasgou o céu e, por um breve instante, iluminou seu rosto marcado pelo tempo. As rugas contavam histórias de luta, de dias árduos sob o sol, de noites frias nas campinas. A idade pesava sobre seu corpo, suas pernas já não tinham o vigor de antes, mas sua mente permanecia lúcida, vagando entre lembranças que se recusavam a partir.
Mergulhado no passado, ele revivia os dias de vaqueiro—tempos que hoje são apenas poeira levada pelo vento. Seus olhos, marejados de saudade, fitavam o nada enquanto resgatava imagens de companheiros que compartilharam sua jornada, de laços forjados na dureza da lida. Gostava daquela vida. Amava sentir a brisa da manhã e o calor do gado selvagem em movimento, sua viola sempre a postos para entoar versos que nasciam do coração.
No canto do quarto, sob os pés de um cachorro magro—seu último companheiro de solidão—jaziam as cordas emudecidas da velha viola. O tempo parecia se curvar diante de suas recordações quando, de repente, um som do lado de fora o fez despertar: o trotar de um cavalo. Não era um simples ruído; era um chamado.
Uma força misteriosa começou a elevá-lo. Seu corpo frágil desprendia-se da cama como se fosse guiado por algo invisível. Uma sonolência inebriante o tomou, mas, ao mesmo tempo, sentiu uma leveza inexplicável. Flutuou até a porta, e com um esforço suave, conseguiu abri-la.
O que viu do lado de fora o deixou sem fôlego. A tempestade havia se dissipado, dando lugar a um dia radiante. O céu azul, pontuado por nuvens brancas, estendia-se infinitamente. Ali, entre as brisas que dançavam, ele avistou a alma de um velho companheiro: seu cavalo Pingo. O corcel, outrora destemido, havia sido ceifado por uma chifrada em plena perseguição a um boi. Agora, surgia diante dele transformado, altivo, alado, exalando bafos que se transformavam em flocos de neve no ar.
Pingo relinchou e, com um movimento de cabeça, convidou-o a montar. O velho caboclo não hesitou. Ao se aproximar do magnífico animal, sentiu seu corpo rejuvenescer, transformando-se novamente em um menino. Com a mesma alegria de outrora, saltou para o dorso do cavalo e, juntos, partiram rumo ao passado.
Voaram sobre paisagens familiares, sobre aquelas boiadas que tantas vezes conduziu. Em um rasante, viu as terras onde bravamente percorreu sob o sol abrasador, sob chuvas torrenciais, sob ventos impiedosos. Estava novamente inteiro, radiante.
Em meio à euforia, pediu a Pingo que pousasse diante de sua antiga escola, sob a sombra da velha paineira. Desceu do cavalo, recostou-se contra o tronco frondoso e, com um último suspiro, fechou os olhos para sempre.