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terça-feira, 31 de maio de 2011

O Diabo e as Mulheres da Tecelagem Japy



Corria o ano de 1958, foi quando o Brasil tornou-se pela primeira vez, campeão mundial de futebol. Eu era um garoto ainda, e com muitos outros, acompanhamos a narração do jogo pelo radio, no boteco do Serafim, que era um português da gema, mas nesse dia, “torcia pelo Brasil”.

No auge do segundo tempo, num avanço em que o Pelé conduzia a bola, a voz do locutor “sumiu”. Foi uma loucura, as pessoas gritavam para o Serafim “acertar o radio”, com toda aquela gritaria, não sabia se aumentava o volume ou servia os famosos “rabo-de-galo” (mistura de pinga com fernet), ele inclusive, estava “tão-alto”, que já não cobrava mais nada pelos petiscos que comíamos e das bebidas dos mais velhos, sorvidas a cada gol do Brasil, naquele dia memorável. 

Após o término do jogo, subi na carroceria de um caminhão que passava pela rua, lotado de alegres pessoas e rodamos pela cidade afora, festejando a conquista, chegando a casa tarde na noite para o desespero de meus pais.

No dia seguinte fui até o boteco, para saber das novidades que ainda repercutia sobre o jogo, pois o Serafim, era o repórter da rua, sabia de tudo o que acontecia na cidade. Ouvi em uma “rodinha de pessoas”, com o português “no meio”, contando que “O Diabo”, havia atacado umas mulheres que trabalhavam na Tecelagem chamada de Japy, que ficava lá pelas bandas da Vila Arens.

O fato tomou enorme proporção, era assunto em todos os lugares da cidade, de tal forma que foi noticiada no único jornal que havia na época, dando conta de uma situação sinistra, envolvendo espanto e indignação da população. “Uma diligência policial se fez necessária, onde o famoso Delegado apelidado de Joaquim Linguiça”, não constatou nada de anormal no local da “aparição” do Diabo, que era em um pequeno capão de mato, com uma trilha, por onde as mulheres caminhavam até chegar ao trabalho, culminando no portão da Tecelagem.

A rádio local noticiava o episódio, entre um programa e outro, estranhando o fato do “Doutô Delegado”, não ter resolvido o caso. Passado uma semana, o assunto voltou à baila, o Diabo tinha atacado outra vez e agora com relato detalhado das trabalhadoras da tecelagem, que ele se vestia de vermelho e rodopiava no ar uma capa preta esvoaçante, e seu rosto, com uma aparência horrível, também soltava urros impressionantes, assustando a mulherada, que até nas calças urinaram.

Serafim estava empolgado com o assunto e todos iam ao seu boteco saber dos detalhes. Sim, porque ele incrementava as noticias da rádio que ele ouvia sem cessar. Falava que a mulherada estava indo trabalhar, acompanhada de seus maridos e filhos, porque nesse tipo de fábrica, a mão-de-obra era constituída em sua maioria, só de mulheres. O contingente maior, era de senhoras, com muito tempo de serviço, eram hábeis teceloas, porem, com o decorrer da idade, não produziam mais o necessário, tomando de preocupação o dono da fabrica, de nacionalidade turca, chamado Salim.

Dentro da fábrica, o gerente “Seu Jorge”, não tinha mais como segurar a situação, as senhoras não queriam mais vir trabalhar. Com muito custo foi preciso à intervenção da Administração, que era o popular “Gerubal Pascoal-Chefe do Pessoal’, que conseguiu persuadi-las, alegando que ia providenciar uma proteção policial, lá na trilha do mato que trazia as mulheres até o portão da Tecelagem

Nos dias que se seguiram a rotina da fabrica estava completamente alterada, uma vez por causa do Diabo, outra, pela baixa produção, pois o Salim não conseguia atender aos pedidos de vendas dos tecidos. Então ele chamou o gerente Jorge e o Gerubal para uma reunião especial e falou:
- Eu quero esse assunto da baixa produção resolvido, eu já estou cansado de falar, não dá para ficar mais segurando essas senhoras que não produzem o suficiente, é melhor aproveitar esse negócio do Diabo que não sei de onde surgiu, e pressioná-las a pedir demissão, Gerubal pediu a palavra e falou:
- Seu Salim, eu já fiz isso e elas não querem perder a indenização que é dobrada, quem tem mais de dez anos de casa, recebe vinte pela Lei.
Furioso Salim disse: -
- Eu não tenho dinheiro para pagar as contas, vocês têm que resolver o assunto se não eu mando embora vocês que fica mais barato.

Depois dessa conversa, no dia seguinte, o Diabo voltou a atacar e o Turco Salim, estava gostando do assunto, porque inclusive algumas delas, não tinham vindo mais trabalhar, até telefonou para a rádio e disse que não precisava ficar anunciando para todo mundo esse negócio do Diabo, era um assunto interno que ele ia resolver de um modo bem satisfatório.  

A estação de rádio parou de noticiar, mas na policia, o assunto estava fervendo, porque pessoas das famílias tinham ido dar “queixa”, e já no dia seguinte, dois “guardas”, foram destacados pelo Delegado, para ficarem de “prontidão” na boca da mata, dando guarida para a mulherada. Lá pelas quatro e trinta da madrugada, um dos guardas que acompanhava o pessoal, escutou um terrível urro que veio lá do meio do mato, “é o Diabo, gritou a mulher que puxava a fila”. Foi um corre-corre danado, as mulheradas acompanhadas de um dos guardas conseguiram chegar até o portão, algumas “molhadas”, outras perderam os chinelos, o almoço que traziam nas marmitas foi perdido pela trilha. O outro guarda que era um valentão, foi à procura do Diabo no meio do mato e ao ouvir aquele urro, deu no pé e foi para a portaria da fábrica.

Os guardas chegaram da fábrica lá na Delegacia e relataram tudo ao “Doutô-Linguiça”, louco da vida, começou a desatinar, chamando-os de medrosos, incompetentes e outras coisas mais.
- “Mais doutô”, eu não vi o Diabo, só escutei o urro, o outro já falou que viu, ele estava de vermelho, botas pretas e parecia ter umas orelhas compridas e cabelos encaracolados, acho que era isso, disse, mas estava meio escuro, pois a entrada do turno da manhã começava às cinco horas.

Joaquim Linguiça estava muito pressionado pelo jornal e a rádio, que não noticiavam outra coisa, que não fosse o ataque do Diabo na mulherada da Tecelagem Japy. Na delegacia, chamou um jagunço, que prestava serviços ao Delegado, para “casos especiais”, era um mulato grande e forte.
Joaquim o chamou no canto da porta, fechou a janela e disse:
- O cabra! Quero esse assunto resolvido, você vai lá e se não puder com o bicho, dê uns tiros para o alto para espantá-lo. Cheio de coragem, o destemido Epaminondas municiou-se de dois revolveres trinta e oito, colocou-os na cinta e foi para o local, “ficar de tocaia”, fazendo isso todos os dias na hora da entrada do pessoal.

Lá na fábrica, o turco Salim vibrava com as noticias que as senhoras não vinham mais trabalhar e outras até pediram demissão e mudaram até de cidade. Chamou então o Gerubal e falou:
- Gerubal, esse Diabo tem trazido sorte para nós.
- É mesmo Seu Salim, já tem doze que pediram as contas e mais umas vinte faltando.
- Mas Gerubal, como é que esse negócio de Diabo apareceu por aqui.
- Eu não sei patrão, está bom assim não é mesmo? Agora não vai mais me mandar embora não é?
- Claro que não disse Salim, só precisamos que mais umas trinta peçam demissão.
- Tudo isso? Só se o Diabo atacar novamente.
- É, faça as suas rezas, quem sabe ele lhe ajude, você já está recrutando moças para o lugar das que já foram?
- Sim Seu Salim, as mocinhas estão trabalhando e com uma produção muito boa, conforme relatou o seu Jorge.

Salim estava contente apesar da desgraça e a fama repentina que sua fábrica tomou, o nome da Japy tinha chegado até nas cidades vizinhas e a noticia chegou até ser veiculado na capital São Paulo, em uma estação que só transmitia novelas.

Passado uma semana o Diabo não atacava mais, parecia que tudo estava tomando a calma no lugar, havendo até disputas das jovens mocinhas para o lugar daquelas que tinham pedido demissão. Algumas daquelas que não tinham vindo mais, com a calmaria, começaram a voltar, preocupando novamente o Sr. Salim.

Chamou o Gerubal e pediu providências, dizendo que se elas voltassem, era para dizer que o diabo poderia atacá-las, porque ele tinha marcado a fisionomia, e assim, se viu novamente pressionado pelo patrão.

Terminado o expediente, foi para a casa muito preocupado e durante algumas noites não dormiu direito, porem, sabia que ele mais o Seu Jorge, tinham que fazer alguma coisa.

Uma bela manhã, a fila da volta das antigas empregadas, tinha aumentado e, no dia seguinte, o Diabo voltou a atacar, mas o Epaminondas estava na espreita, esperando o lazarento. E foi quando o maldito pulou do mato, envolto em sua capa e soltando aqueles urros de enlouquecer qualquer um. Epaminondas soltou um palavrão e falou:

- Seu satanás dos infernos, venha aqui me pegar, você só ataca as mulheres, chegue aqui que sou cabra-macho e de saco roxo. Os dois ficaram frente-a-frente, daí, um estampido foi ouvido, e o Diabo caiu no chão, não se mexia! Todos que escutaram o som do projétil, principalmente na fábrica, correram para o local e constataram uma cena terrível, teria morrido? Epaminondas ainda com o revolver na mão pediu que ninguém chegasse perto e mandou alguém rapidamente telefonar para o Joaquim Linguiça vir o mais rápido possível, para examinar o corpo do infeliz. Lá chegando, o Delegado notou que a máscara que envolvia o rosto, estava meio solta.

Com as mãos tremulas, hesitou em retirá-la, quem seria aquela pessoa travestida de Diabo? Pensou nos seus trinta e cinco anos de carreira, onde nenhum fato daquela natureza tinha acontecido, era um momento de júbilo para Joaquim. Sua velha memória começou a divagar, pensou na promoção que o fato poderia lhe dar, conseguindo uma aposentadoria com vencimentos mais altos.

Num repente, pediu que chamasse a reportagem do jornal, queria ter o privilégio de sair na foto e a manchete poderia lhe render tudo o pensou naqueles minutos, então que se passou foi inenarrável!

Para o espanto de todos, foi constatado pelo velho policial, que o Diabo era o popularíssimo Gerubal Pascoal, Chefe do Pessoal.

O povo todo da cidade por vários dias ficou comentando a tragédia. A Polícia, capitaneada pelo glorioso Joaquim Linguiça, foi até a casa de o Gerubal interrogar a mulher. Ela acabou confessando que fez a fantasia do Diabo e comprou aquela máscara que cobria o rosto, em uma loja da cidade, dizendo que ele estava fazendo aquilo, porque tinha família para sustentar e muito receio de ser mandado embora pelo Sr. Salim.

O empresário ficou apavorado, e fugiu para a Turquia, pois em outras palavras, foi o mentor intelectual do caso, deixou no seu lugar o filho, que não tinha experiência nenhuma com o negócio e faliu rapidamente, ficando muita gente sem receber nenhum centavo da empresa.

Hoje em dia, o local está abandonado, depois da falência, um supermercado se instalou e brevemente também faliu, depois veio uma rede de grande marca, a qual também não teve sucesso, depois uma concessionária que também não deu certo. Todos os empresários que tiveram seus negócios ali, diziam que nas manhãs frias de inverno, aparecia o fantasma do Gerubal, urrando e pedindo o dinheiro de sua indenização.

Esse caso virou uma lenda na cidade, e até hoje, pelos cantos escuros, se fala da história do Diabo que atacava as mulheres da Tecelagem da Japy.    



segunda-feira, 23 de maio de 2011

A LOCOMOTIVA DO TEMPO


A LOCOMOTIVA DO TEMPO



Como em um passe de mágica, desprendeu-se de seu passado. Toda imponente e barulhenta surgiu na curva do tempo, o som aturdido e abafado espantando algumas aves que permaneciam na beira da estrada, e para impressionar ainda mais, soltou um apito estridente anunciando a chegada na estação da recordação.

Tudo isso vinha acompanhado de uma fumaça um pouco enegrecida que saia pela chaminé como se fosse um imenso rolo, resultado do esforço descomunal de seu corpo que se apresentava como uma fornalha incandescente, produzindo vapor para alavancar as rodas e movimentar aqueles vagões pelas cidades e sertões em busca do relacionamento entre as pessoas e o progresso produtivo que transportava.

O maquinista e o seu ajudante com o tradicional uniforme sujo de graxa e óleo observavam os manômetros e outros medidores de pressão, que ficavam espalhados sobre a caldeira e, através do buraco de entrada do combustível, o ajudante ia jogando pequenas toras de lenha na fornalha, para saciar a sede e a fome da imensa maquina obcecada na produção do vapor.


Tudo isso remete ao meu tempo de menino, quando na estação de trem da velha Banharão,(hoje não existe mais), tive a oportunidade de ver uma composição capitaneada por uma Maria-Fumaça, ainda operando naquela época, transportando gado naqueles vagões fedorentos, mais bonito de se ver.

Esse passado jamais se apagará de minha memória, eram as férias que passávamos na fazenda de café do meu avô Giuseppe, situada na cidade de Jaú, onde nasci. Essa época, não muito distante, foi extremamente nostálgica para mim, fez-me divagar e caminhar um pouco pelas estradas de ferro.

 Esse tipo de transporte, trouxe muitos acontecimentos importantes da nossa historia, ajudando a colocar o nosso glorioso Estado de São Paulo, como um dos pioneiros dessa imensa nação.

Assim sendo, durante muitos anos, São Paulo foi forte por causa do café, e chegou onde está porque as ferrovias foram projetadas e baseadas nesse produto, onde até hoje, o Brasil é um dos grandes produtores.

Não poderia deixar de mencionar também o transporte de outros materiais e de passageiros, importantíssimo como fator de colonização e oportunidade para que as pessoas pudessem viajar de um ponto a outro, trazendo novos horizontes, de forma a aumentar suas oportunidades de melhoria de vida, baseadas nos interesses dos barões do café.

Após o declínio dessa cultura, a modernização das ferrovias ficou para trás e, aliada ao custo de manutenção, deu lugar a indústria automobilística que levou a degradação muito rápida, o que é uma pena.

Hoje o Brasil está “montado sobre quatro rodas”, e as estradas de ferro foram totalmente extintas e encontram-se sucateadas em galpões e algumas peças nos museus especializados, como em Jundiaí, na antiga Companhia Paulista.

Para não esquecer esse passado, recordo-me da antiga estação de Jundiaí, de onde partíamos para aquelas férias maravilhosas, e ficávamos “arranchados” no casarão dos meus avôs maternos Giuseppe e Domingas, na velha Banharão, distrito da cidade de Jaú, (oh! quantas saudades).

Para escrever essa crônica, estive na estação de Jundiaí, em busca de uma foto para ilustrar a matéria e o que encontrei, foi apenas uma locomotiva da antiga Sorocabana que não me entusiasmou. O que eu vi foi muita desolação, sendo hoje utilizada apenas para um trem de subúrbio que faz a cidade de Jundiaí até arrabaldes de São Paulo.

Para enaltecer esse passado glorioso, busquei nos arquivos do museu ferroviário, alguma citação sobre a história da Cia Paulista e a estação de Jundiaí e, pude anotar algumas que transcrevo aqui:

A linha - tronco da Cia. Paulista foi aberta com seu primeiro trecho, até Campinas, em 1872. A partir daí, foi prolongada até Rio Claro, em 1876 e depois continuou com a aquisição da E.F. Rio-Clarense, em 1892. Prosseguiu com sua linha, depois de expandi-la para a bitola larga, até São Carlos em 1922 e Rincão em 1928.

Com a compra da seção leste da São Paulo-Goiaz em 1927, expandiu a bitola larga por suas linhas, atravessando o rio Mogi-Guaçu até Colômbia, e cruzando-o de volta até Bebedouro em 1929, chegando finalmente, no Rio Grande em 1930, onde estacionou. Em 1971, a FEPASA passou a controlar a linha, e tudo se acabou...

Os últimos trens trafegaram pela linha até março de 2001, apenas no trecho Campinas-Araraquara.

Com relação à estação, foi inaugurada em 1898, aproveitando um prédio já existente no local, que ficava no final dos terrenos das oficinas da ferrovia, hoje ao lado de um dos viadutos (Ponte São João). 


Para lembrar ainda mais esse período, recordo-me agora de dois passeios efetuados através de um comboio, carreados por Maria-Fumaça, que são denominados turísticos, encantando os passageiros até nos dias de hoje, esbanjando muita categoria. O Primeiro foi partindo da estação de Anhumas até Jaguariúna, que nos tempos antigos era o caminho percorrido pelos Bandeirantes, tropeiros e boiadeiros, rumo a Goiás e Mato Grosso.

Para não fugir a regra, esse ramal ferroviário, floresceu com os engenhos de cana açúcar e, depois, das enormes plantações de café.

Foi um dia maravilhoso, com muitos componentes da família e amigos dirigindo-se em um microônibus para a estação, onde o mano Luizinho nos aguardava com a Geralda, para iniciarmos a maravilhosa viagem naquele comboio até a cidade de Jaguariúna, culminando com um almoço espetacular no chamado “Bar da praia.”

Pude ver e sentir com emoção, a velha Maria-Fumaça expelindo fogo e brasas pela chaminé que caiam sobre os vagões que acompanhavam a paisagem em uma marcha lenta, mas muito elegante, enquanto ao meu lado um guia da viagem ia contando fatos daquela época.

O pensamento naquele momento foi transportado para a fundação da cidade, onde por de trás de tudo havia sempre um coronel, no caso em questão foi o Amâncio Bueno (primo de Campos Salles, que foi presidente da Republica), que cedeu o terreno para construir a estação em suas terras, atualmente Fazenda Serrinha.

Outro passeio não menos espetacular, foi com minha esposa Dijanira La pelas bandas do Rio Grande do Sul, mais precisamente no trecho que vai de Bento Gonçalves a Carlos Barbosa, passando por Garibaldi.

Esse trecho foi recuperado, incluindo toda a composição em especial a velha Maria Fumaça, que estava abandonada como uma sucata ferroviária; faz o trajeto referenciado, de 23 km, com uma velocidade de 30 km, em uma hora e trinta minutos.

O passeio é todo animado por músicos e artistas, teve muita degustação de vinho e champagne (na parada em Garibaldi), alem de corais Italianos.

Muitos turistas fazem essa viagem. A Maria Fumaça da Serra Gaúcha é o maior sucesso ferroviário de um país que não anda mais nos trilhos!     

sábado, 14 de maio de 2011

O ESCULTOR E A FONTE



Fonte da Praça de Espanha - Roma - Itália

A praça daquela pequena cidade situada em frente à igreja estava em festa, não cabia mais ninguém. Era dia santo, as pessoas se acotovelavam e a cruzavam ansiosamente, aguardando o inicio da procissão.

Nesse mesmo lugar em outras ocasiões, os aldeões ouviam os proclamas do administrador da cidade, impondo severos impostos aos moradores, que pagavam com muito sacrifício, amaldiçoando o velho alcaide, representado por uma estátua fincada a poucos metros dali. Foi esculpida em granito branco, por um mestre do oficio vindo da cidade grande, que pelos serviços, não recebeu nenhuma paga, o que muito lhe aborreceu e também amaldiçoou o solicitante, no dia que foi embora.

E assim procedia com outras pessoas não pagando corretamente às prestações de serviços, sendo o dinheiro desviado dos cofres da comunidade, para o seu recôndito castelo, não destinando recursos para outras obras, que o povo merecia, pelos sacrifícios realizados.

A cidade era muito aprazível, os muros que a cercavam, em estilo medieval, ostentavam em seu interior, edificações seculares que sombreavam as poucas vielas,
trazendo encantos perfumados nas floreiras espalhadas sob as janelas, onde as senhoras faziam os seus pedidos, aos vendedores de frutas e verduras, que ficavam circulando nas vielas.

Mas o momento era especial, pois dias antes, chegou um recado ao pároco, encaminhado pelo Prefeito, dizendo para repassar aos seus fieis na missa de domingo, que uma coisa muito boa iria acontecer, e a noticia seria dada, antes do inicio da procissão. O boato correu fronteiras, trazendo dessa forma, o escultor para a cidade, na esperança de receber o pagamento pela estátua, que ficou tão perfeita, que alguns diziam, só faltava falar.

O padre já estava impaciente, uma vez que o arauto do alcaide ainda não havia chegado, para ler naquele bendito pergaminho, que continha a notícia.     

Ao som de um tropel de cavalo, chegou o mensageiro, apeou, tirou o pó da garganta com um gole de água fornecido por um aldeão e começou a ler. 

- Por ordem do nosso amado Prefeito, informo que... Nesse momento, um estrondo aconteceu no céu, seguido de uma forte ventania, e o pergaminho saltou de suas mãos caindo no solo, bem perto do escultor que estava entre o povo.

Ficou estupefato com o que leu! As pessoas com aquela tempestade caindo, correram para abrigarem-se na igreja. A chuva caia... Imóvel no local amassou o papel, enfiou no bolso e começou a esbravejar, soltando urros de indignação.

As pessoas de longe queriam saber da noticia, mas chovia muito e não se atreviam chegar perto. Foi quando caminhou até uma loja de ferragens, apanhou uma marreta que estava exposta para a venda, dirigiu-se até a estátua e começou a marretar a sua bela obra, que ficou somente na base. No ultimo golpe, um esguicho de água molhou o seu rosto cansado. Olhou para o solo e constatou que atingiu o velho aqueduto que abastecia à cidade.

Sua ira era tão grande que de repente teve um momento de lucidez, então em alto e bom som, bradou para o povo que ainda estava abrigado em alguns lugares que contornavam a praça.

- Vou construir nesse local, aproveitando o veio da água, uma fonte de muita beleza, para refrescar o povo nos dias de verão e servir de contemplação.

Um rico comerciante apreciador das belas artes, por nome Pierluigi que tudo ali presenciava, aproximou-se e disse:
- Caro Signori Domenico, serei o seu patrono nessa empreitada, acomode suas coisas em um dos meus aposentos e dê início a sua obra. Financiarei tudo em prol do nosso povo, para que tenham mais alegria quando vierem à cidade.

- Ao saber do acontecido, Dom Cármino, iniciou uma verdadeira guerra com o escultor Domenico e seu patrono Pierluigi, não conseguindo o seu intuito, que era o de destruir os vestígios do começo da obra, pois o povo estava apoiando o escultor e seu patrono, vigiando diuturnamente o local.

E assim, todas as pessoas que passavam pelo local, faziam aquela mesma pergunta:

- Signori Domenico, o que estava escrito...

- Não posso dizer, com o tempo todos vão entender o meu gesto.

Terminado a construção, houve festejos, com o povo dançando e entoando canções em louvor as águas que corriam na fonte e a bela estação da primavera, onde as flores predominavam nas mãos das pessoas.

No dia da partida do escultor, ao receber de seu patrono o pagamento pelos seus serviços, foi lhe perguntado mais uma vez.
     
- Domenico, sei que tem evitado dizer o conteúdo do pergaminho que Dom Cármino entregou para o seu fiel escudeiro ler, e que o vento levou às suas mãos.
- O que dizia...
- Não posso... Só tenho a dizer:

O cuore há speranza che scorre fonti”
(o coração tem esperança, faz jorrar as fontes).

FONTANA DEL TRITONE
A Fontana del Tritone, foi uma das primeiras fontes de Gian Lorenzo Bernini, localiza-se na Piazza Barberini, em Roma, encomendada  pelo Papa Urbano VIII, um amante da arte e fã do escultor. Bernini a esculpiu entre 1642 e 1643,   indiscutivelmente barroca e de grande dramaticidade.


A escultura mostra Tritone, mítico personagem da mitologia grega, filho de Netuno, cujo tronco era de um homem e as pernas eram a cauda de um peixe, sorvendo água de uma concha, apoiado por quatro grandes peixes de duras feições.


Era natural na época de Bernini que todos os seres representados fossem de grande exatidão fisionômica, másculo e artisticamente perfeito.



Através do tempo, algumas formas especificas de esculturas foram mais utilizadas que outras: O busto, a estátua equestre e as fontes de água, especialmente em Roma, para coroar seus fabulosos aquedutos.

A CIÊNCIA ADIVINHATÓRIA

Desde os tempos imemoriais, tem o homem procurado antever os efeitos de origem física, biológica e de inúmeras outras, surpreendendo as leis...