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quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

JOÃO-DE-BARRO




A tarde de verão que era majestosa, repentinamente, transformou-se em um céu carregado de nuvens. Vieram os relâmpagos e ouvi o barulho de trovões anunciando uma tempestade, depois, uma pesada chuva.

Olhei para o solo barrento na beira do meu gramado e percebi o corre-corre de alguns pássaros em busca de alimentos, uma vez que inúmeras larvas e insetos brotavam das entranhas da terra.

Ali estava acontecendo o cio... Sedenta de amor, a terra pedia a fecundação, através do plantio de sementes, para que, em sua gestação, gerassem novos frutos, complementando seu estado de felicidade, acariciando suas novas crias, propiciando, aos seres humanos, alimentos saudáveis para a continuidade das espécies.

A cena era maravilhosa. Busquei em meu embornal, no quartinho de ferramentas, algumas sementes que estavam esperando esse momento maravilhoso. Enquanto semeava nas covas mais fundas, os pássaros continuavam a procurar os insetos para alimentar os filhotes que soltavam trinos altos, pedindo aos pais a comida. Foi nesse momento que ouvi um cantar mais estridente, bem próximo, ali naquele barro vermelho.

Era um casal de João-de-barro que, freneticamente, pedia passagem, chegando até dar voos rasantes perto da minha cabeça, expulsando-me do local; queriam aquele barro para iniciar a construção de seu ninho.

Observei, alegremente, todo o trabalhão incessante do casal, e segui-os com os olhos para ver aonde levavam, nos bicos, as pelotas de barro. Notei, com alegria, que era bem na minha área de lazer, na terça do telhado, acima do fogão de lenha.

Logo escureceu e o trabalho operário dos dois parceiros terminou, o meu de observador também. Recolhi-me aos meus aposentos e busquei uma literatura em que pudesse ter mais informações a respeito desse magnífico pássaro.

Fiquei sabendo que o casal é único, ou seja, são parceiros até que a morte os separe. No dia seguinte, logo pela manhã, fui fazer as vezes de ferrenho observador, ficando contente em vê-los na obcecada tarefa da construção do ninho.

A tarefa de construção continuava; era um vai e vem desenfreado do casal, no transporte das pelotinhas de barro sob o telhado, colocando-as na base sobre a viga de madeira. O entusiasmo era grande, e quando eles se ausentavam da busca, era porque estavam trançando pequenas raízes, em outro local, para fortalecer as paredes do ninho. Nesse momento, corri para a torneira do jardim, peguei uma vasilha com água e coloquei em cima daquele barro perto do gramado que já estava secando, facilitando a árdua jornada dos “passaritos”.

E assim, fui ajudando os dois naquela empreitada. Era maravilhoso ver e acompanhar a mesma rotina, que durou vários dias. Logo fui me municiando de dispositivos para poder observá-los à distância; então, arrumei um binóculo e uma câmera digital, para ir registrando a evolução da obra!

Com os olhos compridos, pude enxergá-los melhor na execução, sem espantá-los; e valeu a pena ficar observando. A evolução que meus olhos presenciavam era uma coisa impressionante! Tudo muito perfeito, a circunferência ao redor da viga que suportava a edificação, os contornos de feixes de raízes formando a malha, como se fosse um alicerce, o desenho da porta de entrada, com a proteção para evitar a entrada de intrusos.

Depois de terminada a casinha, iniciou-se um namoro meio maroto nas árvores, próximo a casa-ninho, até que um dia não mais notei a presença do macho; percebi, então, que estava examinando as redondezas para ver a fertilidade da alimentação para os futuros filhotes, enquanto a fêmea iniciou a postura dos ovos.

Após o terceiro dia do início do choco, notei que quem estava alimentando a fêmea, no ninho, era outro macho, bem maior que aquele que a ajudou na construção da morada. Sim, porque ela não podia sair, para que todos os ovos tivessem sucesso no nascimento dos filhotes.

O que teria acontecido? Fiquei em observação mais detalhada, até que, na tarde do quarto dia, houve uma luta feroz no galho da árvore, culminando com a retirada do intruso, que queria dar continuidade como condutor do casal, antes que se transformasse em família com o nascimento dos filhotes.

Será que houve uma traição? Certamente que não, porque o macho não edificou uma parede na porta... Diz uma lenda do cancioneiro popular rural que, quando isso acontece, ele condena a fêmea dessa forma e parte para uma reclusão até a morte. Talvez fosse um macho viúvo querendo aproveitar a oportunidade para formar uma nova parceria, que foi, energicamente, repudiada.

Fiquei extremamente feliz em ver que tudo correu bem; depois de vários dias de choco, nasceram três belos filhotes, que o macho alimentou.

Passado todos esses dias, ela saiu de seu confinamento e também ajudou o companheiro na criação das pequeninas aves que, logo, se tornaram bem maiores e seguiram os seus destinos, sabe-se lá por onde.

Creio que darão continuidade à tradição, procurando parceiros para toda uma eternidade. Esse tema encantador continuará servindo de inspiração para poetas, compositores de moda-de-viola, seresteiros, também de escritores e cronistas, relatando, através de canções, e “proseando no conto de causos”.

terça-feira, 23 de dezembro de 2014

O SOLAR DO BARÃO DE JUNDIAÍ



Recentemente, estive visitando o Museu Histórico e Cultural de Jundiaí e pude entender melhor o significado dessa portentosa construção, depois de ouvir as muitas explicações históricas do meu cicerone, o Sr. Wilson Ricardo Mingorance, que faz ali um trabalho de pesquisa, uma vez que, nesse ano de 2012, o Casarão, mais conhecido por Solar do Barão, comemora o seu sesquicentenário.

Mas de onde vem o significado da palavra Solar? Segundo consta, é uma casa de família nobre, também utilizada para identificar uma residência antiga de grande luxo e conforto, relativo à sua época. Um solar podia ser habitado por nobres ou, simplesmente, uma família pertencente à elite tradicional, marcando uma fase do Brasil, a chamada de o “ciclo do café”,  a que pertenceu o Sr.Antonio de Queiroz Telles, o “Barão de Jundiaí”.

Nos meus tempos de jovem, frequentador da Praça Governador Pedro de Toledo, que dava acesso ao antigo cine Ypiranga, passava em frente àquela construção e ficava admirando e imaginando os seus tempos de glórias, quando o Barão hospedou pessoas famosas, entre elas o segundo imperador do Brasil, D.Pedro II, descrito por alguns, como uma figura bonachona e despreocupado com a governabilidade, uma vez que estava cercado por bajuladores e oportunistas, que davam a ele o tom de conduta; mas a meu ver, que li toda sua biografia, constatei que foi um ilustre brasileiro, trazendo para sua pátria, o progresso que se acentuava, necessário para o bom desenvolvimento e os costumes da época.

Voltando ao casarão... Quando por ali passava, percebia que estava em adiantado estado de ruínas, podendo-se notar, pelo telhado destruído, a deterioração daquele patrimônio cultural de nossa cidade. O clamor dos historiadores e pessoas influentes da sociedade batalharam, junto à Prefeitura, por sua reforma, ocorrendo sua inauguração, em 1965.

O fundador do então museu foi o padre Antonio Maria Stafuzza; hoje, está sob a direção de Henrique Jahnel Chrispim, subordinado à Secretaria Municipal de Cultura, que tem à frente a professora Penha Maria Camunhas Martins; tem, como colaboradores, o historiador Geraldo Barbosa Tomanik e o artista plástico João Borin, responsáveis pelas exposições nas diversas salas do casarão, que também empresta o nome à rua em que se encontra edificado.

Depois da visita em seu interior, fui apreciar o jardim nos fundos do casarão/museu, onde existe um pátio mostrando, em um dos corredores, vestígios de um muro construído em forma de taipa, registrando um tipo de construção de fazer inveja aos atuais arquitetos, engenheiros e construtores. Está totalmente arborizado, onde poucas pessoas desfrutam o descanso merecido em seus intervalos de jornadas do trabalho, com um silêncio encantador. 

Difícil acreditar que, em pleno centro barulhento da cidade, existe esse local, deixando o pensamento correr solto em busca de outras fontes inspiradoras de um passado distante.
Salve! seus idealizadores e mantenedores, entregando para a cidade, totalmente revitalizada, essa bela construção, onde a cultura poética desfila de forma harmoniosa.

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sábado, 13 de dezembro de 2014

O CASAMENTO DO LOBISOMEM E A MÃE D'AGUA


Na pequena cabana do roceiro-lenhador, a tarde se fez noite. Pela janela do casebre, via-se um pequeno clarão, provocado pela vela acesa sobre a mesa, onde estava um pedaço de pão endurecido, para saciar a fome daquele homem, de grande musculatura, em razão de seus golpes vigorosos do machado, no corte de lenha para acender o fogo e aquecer o ambiente, naquelas noites frias de invernos chuvosos.

Morava sozinho. Era o sétimo filho de uma família que se mudou do pequeno vilarejo para melhorar de vida; não acompanhou seu pessoal; ficou, a mando do pai, para colher a última safra de milho que ainda demoraria mais alguns meses e, após a colheita, juntar-se-ia aos pais e a todas as suas irmãs, pois era o único filho homem e, sobravam-lhe todos os serviços pesados da casa.

E, assim, foi vivendo aquela criatura de modos estranhos, arredio, inquieto nas noites de luar, quando contemplava o vazio da escuridão com olhares soturnos, voltados para aquela montanha que predominava o vale, entrecortado por um belo riacho.

Um dia... Acendeu um cigarro de palha e ficou aguardando a noite esperada de sua vida solitária; olhou pela janela e viu o luar crescendo. Sentiu um arrepio no corpo, o sangue ferveu-lhe nas veias, entrou em agonia, meteu o pé na porta e saiu, como um foguete, em direção à montanha.

Subiu vigorosamente o aclive e chegou ao cume, contemplou o vale e o riacho caudaloso, de onde avistou, com os olhos aguçados, o corpo de uma mulher, que o atraía com um canto hipnotizante.

Ele já percebia os longos pelos nos braços; uivou em direção aos céus, rosnou com a boca aberta por onde salivava imensamente, desceu a galope em um trote louco, pensou em sua mãe que não estava ali para segurá-lo e acalmar seu ímpeto, uma vez que só ela sabia daquele segredo.

Sentiu a fúria dos aloprados penetrando em seu íntimo; não se conteve e partiu, em uma desabalada carreira, em busca daquele corpo de mulher, que estava sentada às margens do riacho, mostrando uma bela silhueta, uma criatura de água doce, que vivia nas matas entre lagos, rios e cachoeiras.

Tinha cabelos longos e olhos verdes e estava banhando-se no lago; ao avistar aquela figura, mergulhou e logo veio à tona, convidando-o para ser seu amante; contemplou-a com sedução monstruosa, envolvido pelo canto de uma sereia...

Não tirou a roupa, pois já estava nu com o corpo coberto por aqueles pelos... Pulou na água, provocando ondas que embalaram os desejos da Mãe D’Água, rolou como um louco e valsou nas águas a dança dos lobos; faminto de volúpia saciou sua sede que mantinha sua vida por uma eternidade. 

O sol raiou para um novo dia, a luz bateu em sua fronte, saiu correndo para refugiar-se, da claridade, em seu reduto de sofrimento solitário.

Mãe D’Água desapareceu daquelas paragens, escondeu-se em uma caverna e depois de alguns meses deu à luz uma criatura horripilante, o famigerado “Caipora”, que se tornou o protetor da caça e das matas, conforme consta uma lenda indígena.

Um velho cacique, em uma roda de fogo, contava aos seus netos que, nas noites de luar, era visto caminhando no dorso de um porco do mato e se notava, então, os seus pés para trás; dizia-se que era para despistar seus seguidores, pois deixava rastros confusos. Todos que o encontravam queriam extingui-lo da face da terra, porque quando o viam, perdiam totalmente o rumo e ficavam confusos nas florestas.

Tornou-se o demônio do mata e perseguia suas presas naquela estranha montaria. Nas noites de luar, contou o velho cacique, se via um pequeno índio transloucado, fumando cachimbo no dorso do animal e pedindo pinga aos caminhantes das estradas. Tornou-se uma lenda, contada até os dias de hoje, e tem sido, então, o guardião da vida animal nas densas florestas.



OS MESTRES DA SABEDORIA E COMPAIXÃO

Mahatma Gandhi foi um reconhecido ativista indiano que lutou durante as décadas de 1920 a 1940 pelo fim do regime colonial inglês e pela ind...