Derrotas ficam nas tabelas. As vitórias, no coração.
O COMEÇO DE TUDO:
Na Rua Zacarias nasceu o nosso orgulho: o Torino. O nome veio em homenagem ao time italiano que sofreu aquela tragédia aérea, mas que ressurgiu com coragem. Para nós, era perfeito: representava a persistência da molecada que jogava descalça, sem camisa, em campos improvisados, onde o juiz era sempre alguém da turma.
Nosso maior rival era o São Cristóvão, da Avenida Paula Penteado. Eles tinham sede em um bar e um personagem folclórico: o famoso “Tio Panca”. Andava se requebrando, cheio de pose, como se fosse craque. Exigia que carregássemos suas coisas, e a gente, claro, morria de medo e raiva dele.
Enquanto sonhávamos com jogos grandes, também inventávamos nossas travessuras. Jogávamos botão na casa do Zé Macabro — que tinha o teto carcomido de cupim, caindo sobre nossas cabeças. Ríamos sem parar quando pregávamos peças com a cédula amarrada no fio de nylon, vendo os adultos se abaixarem para pegar e desistirem xingando, enquanto as meninas gargalhavam do outro lado da rua.
Até que conseguimos comprar o nosso primeiro jogo de camisas, fruto de rifas e muito esforço. Foi a glória! Então decidimos desafiar o São Cristóvão. A negociação foi esquisita: “Tio Panca” já queria saber nossos segredos, quem era o melhor jogador, se tínhamos tática. O Zé Macabro, nosso “relações públicas”, aceitou uns goles de pinga que nos ofereceram e saiu de lá trançando as pernas, mas com o jogo marcado.
No domingo, entramos em campo. Foi duro. O São Cristóvão sufocava a gente, até que o Crau, nosso craque, chutou forte. A bola ia para fora… quando o Zé Macabro, estrategicamente encostado na trave, meteu o pé torto e desviou para dentro. Gol! A torcida nossa foi ao delírio. O juiz, que era da turma, validou. A confusão foi geral, terminamos correndo pelas ruas, alguns meio pelados, roupas na mão, escapando da fúria rival.
O Torino acabou quando o Aécio, nosso zagueirão fundador, mudou-se levando camisas e bola. Mas o futebol nunca morreu. Nasceu o Grená, que viajava nos campeonatos dentro do caminhão de macarrão “Gallo” do primo Serjão — fechado, cheio de cheiro de farinha, e a gente lá dentro, com a porta entreaberta para não sufocar.
Depois veio o futsal. O Tecão, meu primo, montou o Credi-City, campeão da cidade. Dali, numa madrugada regada a risadas na casa do Júnior, nasceu o Sardonicus — nome estranho, mas que dizia muito sobre nós: riso sarcástico, jeito debochado.
E foi com o Sardonicus que vivemos uma das maiores emoções. No torneio Marechal Mallet, caímos logo contra o poderosíssimo Unidos, campeão estadual. O retrospecto deles? Goleadas de 20 a 0. Entramos só para não passar vergonha. Perdemos, é verdade, mas o jogo ficou marcado por um momento mágico: o Rui, nosso driblador, passou a bola entre as pernas do capitão da seleção paulista. A torcida foi à loucura. No placar, derrota. No coração, vitória.
Final surpreendente
Hoje, quando folheio as fotos antigas, penso nos que já partiram — o Tecão, o Téia, o Ramos, o Ismael — e sinto um aperto no peito. Mas logo me vem o sorriso: talvez o maior título da nossa vida não tenha sido um troféu, mas o simples fato de termos jogado juntos, lado a lado, dividindo bola, gargalhadas e histórias que ainda hoje brilham como gols na memória.
✍️
Se esta crônica tocar alguém, mesmo que por um instante,
então ela cumpriu seu destino:
ser ponte
entre o que fui e o que ainda sou.
Toninho Vendramini
Cada texto é uma janela aberta para o mundo — um mundo que vivi, sonhei ou apenas imaginei com olhos de quem nunca deixou de se encantar.
Não escrevo para guardar. Escrevo para
libertar.
Libertar memórias, afetos, lugares e pessoas
que ainda vivem em mim.
Cada linha é um convite, cada frase uma travessia.
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